BORDERLINE

O meu vizinho é carpinteiro,
Algibebe de Dona Morte,
Ponteia e cose, o dia inteiro,
Fatos de pau de toda a sorte:
Mogno, debruados de veludo,
Flandres gentil, pinho do Norte...
Ora eu que trago um sobretudo
Que já me vai a aborrecer,
Fui-me lá, ontem: (era Entrudo,
Havia imenso que fazer...)
- Olá, bom homem! quero um fato,
Tem que me sirva? - Vamos ver...
Olhou, mexeu na casa toda.
- Eis aqui um e bem barato.
- Está na moda? - Está na moda.
(Gostei e nem quis apreçá-lo:
Muito justinho, pouca roda...)
- Quando posso mandar buscá-lo?
- Ao pôr-do-Sol. Vou dá-lo a ferro:
(Pôs-se o bom homem a aplainá-lo...)


Ó meus Amigos! salvo erro,
Juro-o pela alma, pelo Céu:
Nenhum de vós, ao meu enterro,
Irá mais dândi, olhai! do que eu!

Paris, 1891.

António Nobre


Nobre poema António, o teu
Que triste, me inspira a viver Só,
Longe de todos
Que para aqui me empurram
para dentro do teu caixão.

Sim, a solidão é um empurrão
Da puta da vida
que são os outros e não tu..
Que fingidos te perguntam, estás bem...
Como se supostamente louco
bem tu não devesses estar,
Sim que a boa educação manda-te perguntar!..

Estás insane, na sua insanidade
Na solidão, de enganosa alteridade
Vazia de conteúdo, às vezes sem limites, bipolar
No agir desencastrado e sem parar ou
Feita de altos e baixos e vazios no estar só,
Cheio de coisas e ideias a fervilhar

Só, estou mas porque quero
Farto, não me apetece guerrear...
Cansado dessa luta, de palavras vãs...
De esperança feita aliança, anel
Expressada desfigurada, falsamente calada
Escuto mentes torpes, calmamente a falar
por gestos passivos cheios de amargura e fel,
disfarçados, vestindo uma amizade da cor do mel.

Guerreiro da Luz